Fernando Pessoa não só se desdobrou, diria intratextualizou em poetas, com os heterónimos, como se desdobrou também tanto quanto se sabe em leituras várias. Numa designada lista bibliográfica -livros citados ou detidos pelo Poeta- ficamos a saber desse pormenor. António Pina Coelho que estuda e divulga os livros lidos pelo Poeta em Os Fundamentos Filosóficos de Obra de Fernando Pessoa*, introduz-nos nesse universo.
Sabe-se, portanto, que terá lido Platão e Aristóteles, Kant e Nietzche.
Ainda que seguindo um impulso de subjectividade quanto a alguns poemas do Pessoa ortónimo e heterónimo, o conteúdo e a própria forma de alguns deles levam-nos a pensar em outros textos de outros poetas. O pensamento lírico, sobretudo, com que os textos se relacionam.
Existe de facto uma intertextualidade em Pessoa. Referências (subjectivas), alusões, paráfrases, epígrafes são algumas das formas de intertextualidade, que cruzam os textos de muitos autores. É um diálogo, por vezes não procurado, outras será o resultado da natureza universal da poesia, enunciado há quase três séculos por Shelley, no seu clássico Defesa da Poesia*: «O grande poema que todos os poetas (...) têm vindo construir desde o começo do mundo»(Pág.68)
Fragmentos ou bocados isolados - no dizer de Shelley- criam vasos comunicantes culturais, produzem um sentido dialógico segundo o qual estamos a ler um autor-outro dentro do autor escolhido. Este recurso vale-se de poder ser, na literatura e não só, consciente ou inconsciente.
Julia Kristeva, que divulga os estudos de Bakhtin, tem um clássico conceito de intertextualidade, que é «todo o texto se constrói como mosaico de citações, todo o texto é absorção e transformação de outro texto.»

Pessoa e Sartre

Náusea. Vontade de nada.
Existir por não morrer.

Poesias Inéditas, 1930-1935, Ática, 1978

Aqui em sentido estricto, a palavra de Pessoa, escrita em 1933, remete para o pensamento existencialista de Sartre, contido numa palavra: Naúsea. Contudo, FP não foi um existencialista, embora tivesse penetrado fundo nos mistérios do existir, sentisse nesse clima do mistério do ser, o transcendentalismo tanto quanto o cepticismo e o niilismo. A vontade de Nada.
Na lista de documentos inéditos que deixou, que inclui livros e leituras, até onde sabemos não constam os nomes de Kierkegaard e Heidegger; o que não quer dizer que os não tenha lido, pelo menos, o primeiro. Todavia leu Nietzsche, terá andado perto de Husserl? Mas, naturalmente, não pôde ler Sartre.
O sentimento do Nada em Pessoa, sobretudo no Ricardo Reis, vem da ideia da morte: «Tudo que cessa é morte» (pág. 114).
Em Jean-Paul Sartre vem de existir. E aqui está o diálogo entre ambos os textos:

«A Naúsea não está dentro de mim: sinto-a além, na parede, nos suspensórios, em toda a parte à minha volta. Constitui um todo com o café; sou eu que estou dentro dela.» ( pág.41).

Mais adiante Roquentin afirma que a Naúsea não o abandonou, e não crê que o abandone tão cedo. «A Naúsea sou eu» - assevera (pág. 216).

Basta, se é que basta hoje com tanta literatura «light», esotérica e de auto-ajuda por esse país fora, basta ler - dizia- o romance A Naúsea* escrito em 1938.
Só por este aspecto «existencial» e cronológico da existência, Fernando Pessoa não o leu, pelos desencontros da vida.


*II volume, Colecção Presenças 13, Editorial Verbo, 1971
*Colecção Filosofia e Ensaios, Guimarães Editores, 1972
* Europa América, Colecção Século XX, 19, 1964

(c) JOÃO TOMAZ PARREIRA

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Comentario por Alina Galliano el agosto 23, 2009 a las 8:21pm
Ah ..Pessoa...Gracias por el texto.
Saludos
Alina

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